segunda-feira, 28 de agosto de 2017

Messier 6: um DSO para fotografar sob poluição luminosa



M6 é um aglomerado aberto de estrelas. Ele está na constelação de Escorpião e com sua magnitude aparente em 4,2 pode ser observado a olho nu com alguma facilidade. São Paulo - capital, onde moro e faço minhas observações e astrofotografias, é a cidade com a poluição luminosa mais alta do Brasil, provavelmente da América Latina e, já li em algumas referências, do Hemisfério Sul do planeta. Mesmo nesse ambiente é possível visualizar esse aglomerado a olho nu dado que as condições de transparência do céu estejam boas e os olhos muito bem adaptados ao escuro. Com binóculos e telescópios a tarefa é bem fácil e muito gratificante.

Mas voltando a M6, Messier 6 ou NGC 6405, esse aglomerado é também conhecido como Aglomerado da Borboleta pela lembrança que a disposição de suas estrelas nos traz. Não vou falar muito sobre ele para não ser repetitivo. Já tem muita coisa na rede sobre isso e acessível a todos. Eu indico, por exemplo, a página da Wikipédia

Por ser um DSO bem brilhante é fácil fotografa-lo de meu ponto de observação. Escolhi nesse final de semana M6 como objeto para treinar a captura de lights, flats, darks e bias. Com aproximadamente 30 lights de 30segundos, 15 flats, 15 darks e 50 bias consegui a foto que vai abaixo. 

M6 a partir de uma DSLR Canon EOS600D


Não usei nenhum tipo de filtro, o que estou considerando começar a fazer para aumentar meu tempo de exposição individual. Para alinhamento, calibração e integração das fotos eu usei o DSS e para o pós-processamento eu usei o Iris

Equipamentos: meu telescópio, um Ritchey-Chrétien 200mm f/D8 e montagem Sirius EQ-G. As câmeras foram uma DSLR Canon EOS 600D (também conhecida como T3i no mercado americano) não modificada e, para guiagem, usei uma QHY5L-II acoplada em uma buscadora de 50mm. 

O aspecto geral da foto me agradou bastante. Apesar de ser um DSO "fácil" de fotografar fiquei especialmente satisfeito, pois esse foi o primeiro que fotografei com um método bem definido de guiagem, captura, calibração e pós-processamento. Com a coisa bem metódica fica fácil perceber os erros, os acertos e as oportunidades de melhoria. Deu para ver bem como essa óptica se comporta: no centro do campo, até uns 70% (estimativa) do campo, a qualidade é bastante boa, mas nas bordas as estrelas estão alongadas (defeito da óptica ou erro de colimação?). Deu para entender bem como a guiagem funciona, como ajustar o software de guiagem (PHD2) e como respondeu bem nesse setup. 

Comparando foto com foto percebe-se que a flexão é pequena e (para minha exigência atual) dá para usar a buscadora tranquilamente como telescópio guia. Além disso, deu para ver que essa montagem carregada com 75% do seu limite está OK (porém, realmente no limite para astrofoto). Outra coisa também é o tratamento da imagem: o DSS funciona que é uma maravilha quando usados os parâmetros corretos. O Iris é muito poderoso, mas acho que daria para extrair mais das fotos, não sei... Fico na dúvida se não faltou sinal para o tratamento ou se é limitação do Iris. Mas isso é algo que terei que trabalhar para decidir se tenho que partir para um Photoshop, por exemplo.

Enfim, gostei do resultado e da noite de trabalho com a astronomia amadora. Estou ansioso para a próxima sessão de observação e astrofotografia.

quarta-feira, 9 de agosto de 2017

Astrofotografia de DSO: calibração de imagem

Essa história de astrofotografia contamina nossa mente. Ao longo das últimas semanas, tenho me dedicado a estudar e entender melhor os conceitos de astrofotografia, em especial fotografia de céu profundo, um novo desafio que coloquei na minha atividade amadora de astronomia. Bom, após alguns anos fotografando planetas – o que é bem interessante – me deparei um pouco cansado dessa modalidade. Ok, existem mudanças na atmosfera visível dos planetas, da posição de suas luas, ocultações, trânsitos… Mas depois de um tempo (e já estou desde 2002 na astronomia amadora) isso acaba ficando realmente repetitivo.

Para dar um tempero e evoluir na atividade, foi um caminho natural para mim ir para fotografia de longa exposição de DSOs. No meu caso, optei por usar um câmera DSLR não modificada para começar com esse tipo de astrofotografia (tenho estudado também o uso de câmeras planetárias para DSO). Eu já possuía uma dessas câmeras, uma Canon EOS600D (nome do mercado europeu, T3i no mercado americano) que uso regularmente para fotografia. Essa câmera é bastante popular na área de astrofotografia de DSO, que demanda longa exposição. Tem um custo mais acessível que uma câmera CCD dedicada com mesmo tamanho de sensor e pode ser usada durante o dia como câmera para fotografia. Seu ruído na faixa de ISO 800 ou 1600 é relativamente baixo, permitindo uma boa sensibilidade e já tenho lido que usar o ISO 1600 é o ponto ideal de compromisso entre sensibilidade e ruído (menor que 1600, maior tempo de exposição; maior que 1600, maior ruído). Sua eficiência quântica (Q.E.) é da ordem de 40%, sendo que CCDs dedicados ficam na casa dos 55% e essas novas câmeras da ZWO ou QHYCCD estão na ordem de 60~65%.

Mas voltando à astrofotografia, a principal coisa que aprendi é que não basta acoplar a câmera, deixá-la aberta por diversos segundos e fazer a foto. Percebi que em astrofotografias de longa exposição são necessários tipos diferentes de quadros para compor a imagem final, melhorando sua qualidade final. Esse processo de mesclar as imagens propriamente ditas do objeto fotografado com esses quadros específicos se chama calibração de imagem. Para quem ainda não sabe do que isso se trata, vou explicar da forma que entendi o que são esses "quadros especiais". Nesse caso, meu foco foi nas DSLR. Vou preparar uma página semelhante caso estejamos usando uma câmera planetária.

Lights
Não é exatamente um frame de calibração, mas a imagem em si. Deixei aqui listado apenas para ter uma visão completa. O software de alinhamento que eu uso – o DSS – os chama de lights, mas você verá por aí as expressões subs, sub-frames ou sub-exposições. A quantidade de light frames que você fará depende do seu tempo disponível, do seu local de observação e de qual objeto você está fotografando. Mas um senso comum diz que quanto mais lights você tiver para compor sua imagem, melhor.

Darks
Os darks são feitos para retirar alguns tipos de defeitos que estão presentes no sensor ou que ocorrem no processo de astrofotografia: pixels mortos, hot pixels, amp glow. Os darks devem ser feitos com exatamente as mesmas características dos lights (ISO, tempo de exposição e temperatura) exceto que o telescópio deve ficar fechado, ou seja, capturando quadros escuros (daí o nome, darks). A questão da temperatura é delicada, pois, ao longo do processo de tomada de quadros, o sensor da câmera vai aquecendo e isso altera um pouco a qualidade dos darks. Duas formas de corrigir isso seriam usar uma câmera refrigerada ou, se a refrigeração não estiver presente, tomar os darks o mais rápido possível após o processo de aquisição dos lights. Isso não garantirá exatamente a mesma temperatura, mas ela será muito próxima. Para o processo de calibração de uma astrofotografia, é senso comum que algo em torno de 20 darks é o suficiente, 30 é o ideal, mais que isso não apresenta ganho sensível.

Flats
Os flats são usados para retirar vinheta da foto (aquele halo circular mais escuro que fica na borda de suas fotos).  Serve também para retirar manchas, marcas de poeira, riscos ou pequenos defeitos físicos que estejam presentes na sua óptica. E acredite, um ou todos esses problemas estão lá, mesmo que você não veja, e vão aparecer na sua foto final. De longe, em minha opinião, são os frames de calibração mais chatos de fazer e ainda estou buscando um método que seja confortável para mim. É importante que os flats sejam feitos com quadros uniformemente iluminados em todo o campo, e isso pode ser obtido de diversas formas. Entre os métodos que achei na internet estão:
  • Apontar seu equipamento para o céu do amanhecer (ponto fraco: a iluminação muda rapidamente, alterando um pouco os flats),
  • Usar um tecido branco cobrindo o telescópio e uma lanterna para iluminar o telescópio assim coberto (ponto fraco: iluminação não uniforme),
  • Usar um tecido branco cobrindo o telescópio e a tela LCD do computador para iluminar o telescópio assim coberto (método que estou usando; pontos fracos: posicionar a tela na posição correta, telescópios de grande abertura ficarão com pontos sem iluminação)
  • Comprar (ou fazer) uma caixa de luz (método que quero usar; ponto fraco: um acessório a mais para usar).
Idealmente, você deve fazer os flats ao longo da seção de fotos. Pode-se faze-los após os darks também ou até no outro dia. O mais importante é não remover a câmera do telescópio de forma que todos os problemas no caminho da óptica (poeira, riscos,....)  permaneçam nos flats na mesma posição que estão nos lights. Mantenha todos os elementos ópticos (filtros, roda de filtro, redutor, aplainador de campo), mantenha a mesma posição de foco e o mesmo ISO. A temperatura não é importante

Bom, como eu tenho feito? Abro o Notepad em modo de tela cheia para ter uma tela branca, uniformemente iluminada. Mantenho as configurações que falei – ISO, foco, exposição,... – e coloco minha DSLR no modo Av (nomenclatura da Canon para controle de exposição pela abertura), deixo a tela do notebook aberta e encostada na abertura do telescópio e faço as fotos. Um jeito de ver se está correto é olhando o histograma da câmera: a exposição deve ficar no meio do gráfico, como em uma foto bem exposta. Com essa configuração eu faço 30 flats. Existem formas mais científicas de fazer isso. Estou estudando cada uma delas e, assim que chegar a alguma conclusão eu descrevo aqui.

Bias
Os bias, também chamados em alguns lugares como offset, são usados para remover o sinal de leitura do chip CCD ou CMOS dos lights. Cada chip CCD ou CMOS está gerando um sinal de leitura ou ruído de leitura (read out signal ou read out noise) que é um sinal eletrônico criado pelo chip apenas pela leitura de luz. Esse é o mais fácil de obter: basta fechar o telescópio, manter o mesmo ISO dos lights e fazer cerca de 30 quadros na velocidade mais rápida de obturador que sua câmera permitir. Eu, por exemplo, com minha atual Canon EOS600D, faço esses bias na velocidade 1/4000.

Todos esses frames (lights, darks, flats e bias) deverão ser lidos no software de alinhamento e empilhamento para então produzir uma imagem. É trabalhoso, mas deverá auxiliar na criação de fotos com menos ruídos, sem vinheta, sem marcas de poeira e aquelas "pattern lines" características dos CMOS.